A ESQUERDA E OS MILITARES NO GOVERNO
Percival Puggina
No
Brasil, com aquela presunçosa superioridade moral que desaba quando confrontada
com o passado e o presente, a esquerda brasileira costuma se apresentar como
isenta de todo preconceito. Seus militantes se proclamam dotados de uma alma
acolhedora, expressa num par de braços abertos à humanidade. Porém, quando
essas virtudes são escrutinadas, se vê que os genocídios do passado são
acolhidos no silêncio e se reproduzem no presente venezuelano; se evidencia que
liberais e conservadores não são tolerados e que, especialmente, o desdém aos
militares e às Forças Armadas atinge as raias do fetiche. O fetiche, no caso,
não é de culto, mas de rejeição.
Como o
Brasil só viveu o “ideal coletivista” na cultura aborígene, a História do
Brasil é dita um desastre do início ao fim. A essa esquerda, em cuja existência
não há feitos a exibir, cabem, então, duas tarefas: recontar a história
nacional de uma forma que lhe convenha e construir, para si mesma, uma
narrativa atraente.
A primeira tarefa visa a produzir esse
sentimento de dívidas e cobranças com as quais a luta de classes se enriquece
com novos formatos e antagonistas. Segundo tal cartilha, desde o “infortúnio”
do Descobrimento, tudo foi desastroso, sem honra nem glória, brio ou valor, num
país de homens e mulheres minúsculos, a não merecerem nota de rodapé em livro
sério, ou plaquinha de bronze em praça de bairro. E isso vale para você que me
lê e para todos os seus ancestrais.
Os militares povoam os ressentimentos
dessa esquerda. Onde sua narrativa não se entrelaça com os fatos de 1964 e dos
anos seguintes, militantes entram em dispneia ou disartria. Precisam
incessantemente evocar, invocar, convocar, cavoucar esse período como condição
para articular o mais simples raciocínio. Por isso dizem que o governo Bolsonaro
tem número excessivo de militares. FHC criou o ministério da Defesa, entregou-o
a um civil e tirou do ministério quatro oficiais generais das três Armas. O PT,
quando no poder, deu um passo mais e nomeou um parlamentar do PCdoB para aquela
pasta que exerce direção superior em relação às Forças Armadas.
Essa animosidade contra os militares é
tão incontrolável que inibe a percepção de um fato bem simples: meio século de
lorotas e histórias mal contadas, visando a desabonar as Forças Armadas, em
nada afetaram a confiança e o respeito que a nação lhes dedica. O prestígio
dessas instituições é a maior derrota da quase sempre eficiente propaganda
esquerdista. Nossas Armas continuam sendo as instituições mais confiáveis do país – pesquisa Datafolha (da Datafolha, vejam
bem!) realizada em junho de 2018.
Invertendo o tradicional loteamento
partidário do governo, da administração pública e do próprio Estado, o
presidente montou uma equipe dominantemente técnica, competente e colocou
militares em certos postos-chaves. Por que o fez? Pelo simples motivo de que
oficiais superiores, treinados em cadeias de comando, têm excelente formação e
são vocacionados ao serviço da pátria e aos interesses comuns (não há guerra
individual). Ademais, aproveitá-los é questão de pura racionalidade em relação
ao investimento feito pelo país em sua formação e em suas carreiras.
* Percival Puggina (74), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é
arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org,
colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o
totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do
Brasil. Integrante do grupo Pensar+.