Percival Puggina
A elite do esquerdismo
brasileiro, tendo à frente Dilma Rousseff e Gleisi Hoffmann, foi a Havana para
o 24º Encontro do Foro de São Paulo. O evento acontece a poucos meses dos
festejos que marcarão 60 anos da renúncia de Fulgencio Batista em 1º de janeiro
de 1959, seguida da tomada do poder por Fidel Castro. Sessenta anos! Vidas
inteiras, do parto ao velório, submetidas aos caprichos e delírios ideológicos
de uma pessoa. Mesmo depois de morto é ele, Fidel, que mantém de pé o vacilante
e falimentar arcabouço ideológico da sua revolução.
Há um equívoco em afirmar que o regime cubano
não funciona. Ele é perfeitamente funcional na perspectiva dos que se apossaram
do poder. O pequeno grupo dirigente, representado pelo Comitê Central do
Partido Comunista Cubano, habita o bem instalado andar superior da sociedade
que o mantém. É um sistema em que a posição de mando não sofre qualquer
ameaça.
Essa é a questão central da política cubana
neste momento: como garantir o poder ao Partido Comunista e retirar o país da
miserável enrascada em que a revolução o meteu. Obama, ao aproximar-se de Cuba,
não fez qualquer exigência e jogou fora uma oportunidade de ouro. Ele queria os
ganhos políticos da aproximação; o povo da ilha, com suas mazelas, que se
danasse. Já o camarada chinês Xi Jiping deu bola e, por esse motivo enviou a
Cuba o secretário geral do Partido Comunista do Vietnã, Nguyen Phu Trong, no
mês de março deste ano. O conselho levado era simples: façam como nós, chineses
e vietnamitas – segurem as rédeas da política e afrouxem as da economia. Deixem
o povo ganhar dinheiro, mas não entreguem a caneta nem a chave da cadeia.
Pelo sim, pelo não, Cuba deu a partida para um
processo constituinte cujas diretrizes já estão praticamente definidas.
Alinham-se aquém do que agradaria aos chineses, mas além do que faria Fidel
sorrir. O texto reafirma o papel reitor do Partido como “força dirigente
superior da sociedade e do Estado” e define Cuba como um “estado socialista de
direito”. De outra parte, reconhece o direito à propriedade privada, o direito
de herança, abre-se para empresas totalmente privadas, inclusive estrangeiras e
– por supuesto - preserva as estatais como sujeitos principais
das atividades econômicas.
Imagino as dores de parto envolvidas no
nascimento desse “bebê de Rosemary”. Quanto deve estar custando àqueles
marxistas-leninistas reconhecer o amontoado de besteiras que praticaram durante
seis décadas na condução da economia! E quanto, por causa disso, padeceu o povo
com o permanente racionamento e os salários simbólicos, suficientes apenas para
disfarçar sua real escravidão!
Pois foi nesse contexto local que se realizou o
24º Foro de São Paulo, presentes ardorosos líderes comunistas do continente.
Pense numa situação desoladora! Lula preso, Fidel morto, Raúl aposentado,
Maduro ferrando a Venezuela, Ortega indo pelo mesmo caminho e Cuba entrando no
mundo dos negócios, aberta aos interesses do grande capital. Credo!
* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense
de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de
jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o Totalitarismo; Cuba, a
Tragédia da Utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil, integrante do grupo
Pensar+.