Percival Puggina
Dias
Toffoli, o paraquedista enxertado por Lula no STF, cassou a decisão do juiz
Sérgio Moro que impusera a José Dirceu o uso de tornozeleira eletrônica. Ao
expedir a ordem, com o pé no estribo do recesso, o ex-funcionário do PT
afirmou, sem revelar o menor constrangimento, que a Segunda Turma (sempre ela!)
concedera “liberdade plena” ao preso e que, portanto, tornozeleira era uma
inibição da liberdade. Daquela, fulgente, de asas ao vento, que o trio
maravilhoso fizera raiar para o pensionista da Papuda.
Liberdade
plena! Claro, por que não? Só porque Dirceu é um criminoso reincidente em
corrupção passiva, condenado em segunda instância por tribunal federal, num
novo processo, a mais de 30 anos de prisão? Como encarcerar, só por isso, um
guerreiro herói do povo brasileiro? Afinal, a matéria adquire urgência absoluta
posto que a carimbada, rotulada e descarada maioria da Segunda Turma vislumbrou
“plausibilidade nos recursos interpostos [pela defesa] quanto à dosimetria da
pena”. Faz sentido. E, se refeitos os cálculos, os 30 anos forem corrigidos
para 30 dias? Para 30 minutos? Já pensaram nisso? Toffoli pensou.
Cai sobre tão insólitas decisões o
silêncio dos adoradores de corruptos, a mais nova seita nacional. Fervilham os
engomados e bem trajados jurisconsultos nos corredores das carceragens. Imagine
leitor, a inveja ao longo do corredor enquanto os demais presos acompanhavam os
passos de Dirceu rumo aos portões do presídio. “Quando sair daqui vou para a
política!”, devem ter jurado a si mesmos.
A Segunda Turma faz a festa dos grandes
escritórios de advocacia criminal! Querem nos convencer de que estamos
presenciando as maravilhas de um ordenamento jurídico perfeito. No firmamento
da democracia, ele faz luzir a constelação dos inabaláveis direitos dos
cidadãos. Dito isso for the record,
bota o pé no chão, deixa de frescura e solta a bandidagem endinheirada. Libera
os amigos. Protege os companheiros.
É
preciso andar de quatro, com o nariz enfiado no chão, para imaginar que [no
firmamento da tal “democracia” da Segunda Turma] os mesmos favores, o mesmo
atendimento urgente em meio àqueles arquivos empoeirados, são conferidos a todo
processo, a toda petição. E que a mesma orelha ministerial esteja sempre
disposta a ouvir todas as arengas e a atender todos os telefonemas. Por quem
nos tomam?
É
instigante observar que os cavaleiros do apocalipse moral do país, veneráveis
patronos da impunidade eterna, ostentam uma característica comum. São
bifrontes. Têm uma face para promover a impunidade, para jurisdicionar e fazer
felizes os grandes corruptos. E outra para – peito estufado de vaidade enferma
– descrever tais atos como virtuoso exercício de sua missão constitucional.
* Percival Puggina (73), membro da
Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular
do site www.puggina.org, colunista de
dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o Totalitarismo;
Cuba, a Tragédia da Utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil, integrante do
grupo Pensar+.