Percival Puggina
Só
alguém excessivamente conservador fica indignado com a exibição a olhos
infantis de garatujas representando um homem negro fazendo sexo anal e oral com
dois brancos enquanto, na mesma tela, duas pessoas buscam prazeres violentando
uma ovelha, uma mulher se diverte com um cão, e, noutro grupo, tudo sugere
pedofilia. Só alguém delirante aponta naquelas imagens um traço deliberadamente
infantil para atrair olhos de crianças. Só o miserável legado moral da tradição
judaico-cristã pode impedir alguém de se empolgar ante o que toscamente
manifestam. Só alguém degenerado pelas aberrações da estética ocidental seria
capaz de afirmar que tais peças são monstrengos em conteúdo e forma. Como não nivelar
em excelência Leda e o Cisne de Leonardo da Vinci e aquela senhora com seu
totó? É preciso ter sobre a infância e sua proteção ideias incompatíveis com a
modernidade para não compreender o quanto resulta artística e pedagógica a
performance de um homem pelado, mãos dadas com um grupo de meninas, ou a de
outro deitado, manuseado por criança. É preciso ser muito fascista para não
quedar em êxtase estético e comoção espiritual diante da performance de um
homem nu ralando o gesso de uma imagem de Nossa Senhora.
Levei
nota zero. Errei uma a uma as respostas que os profetas dos modismos dizem
esperar, mas sei que meu gosto não faz norma e este é um país livre. Contanto
que se protejam as crianças e não sejam cometidos quaisquer crimes, "o que
é de gosto regala a vida". Exibam,
façam e curtam o que bem entenderem! Lambuzem-se em porcarias! Mas me permitam
dizer: vejo uma clara matriz política e ideológica nessa sequência de episódios
e na linha de zagueiros que os protege mesmo quando crimes são praticados.
Todos se posicionam bem à esquerda do bufê ideológico, num tipo de esquerdismo
que disso se alimenta. Tais exibições são manifestos políticos de seus
militantes, dedicados à empreitada de destruir as bases da cultura ocidental,
sem o que não prosperam suas ideias e projeto de poder. Não é por acaso, então,
que as obras põem alvo no cristianismo, na educação e na infância. Atuam na
imprensa, em instituições públicas ligadas a Direitos Humanos, nos meios
culturais e na liberação de recursos da LIC inclusive para o Queermuseu, em
vista de sua declarada finalidade pedagógica...
Não
defende a infância quem, em nome de alguma liberdade, a exponha à libertinagem,
nem protege a arte quem atribui esse nome a qualquer aleijão. Muitos que, em
funções de Estado, deveriam estar na linha de frente protegendo a infância, e
em atividades culturais defendendo a arte, sacralizam o profano e o execrável
enquanto, sob suas vistas, o sagrado é profanado e crimes são cometidos.
Affonso Romano Santana, em entrevista a Adroaldo Bauer em Porto Alegre, no
ano de 2008, não hesitou: "Lamento
muito informar que ao contrário do que se acreditou no século XX, a arte não
acabou, a arte é uma fatalidade do espírito humano e arte não é qualquer coisa
que qualquer um diga que é arte, nem é crítico qualquer um que escreva sobre
arte".
Os fatos a que me referi se desenrolam sob nossos olhos, numa cadência cotidiana
de avanços que confiam na tolerância de uma cultura superior que querem
destruir. Há neles um núcleo comum, um objetivo final essencialmente mau para a
arte, para sociedade, para as famílias e para as crianças.
* Percival Puggina (72), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é
arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org,
colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o
totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil.
integrante do grupo Pensar+.