Ingênuo eu. Tão
ingênuo que, se não visse as imagens, não acreditaria no que estava em curso à
mesa do Senado da República. Mesa posta, servida com quentinha, mastigação e lábios
torcidos acionando palitos hidráulicos. Selfies e Face Times mostrando à plebe
aquela fornida linha de frente dos interesses populares, armada a garfos e
facas. Bom proveito, Brasil "progressista"!
Ali estavam as senadoras
Gleisi Hoffmann (PT-PR), Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), Regina Sousa (PT-PI),
Fátima Bezerra (PT-RN) e Lídice da Mata (PSB-BA), em plena pirataria do poder
senatorial. Às costas, como convém a piratas, alguns marmanjos se postavam qual
papagaios, filando a ridícula notoriedade proporcionada pelas imagens.
"Mamãe, saí na Globo!". Crrác, crrác.
O objetivo
daquele desrespeitoso gesto de ruptura com o Regimento Interno e com a ética
parlamentar era o mesmo que sempre observei como determinante de ações públicas
promovidas por partidos e movimentos de esquerda: impor à maioria ou às regras
do jogo aquilo que é apenas vontade de uns poucos.
Desde meus
tempos colegiais, aliás, pude observar, na repetição desse comportamento, uma
disposição para a conduta histérica. De início, em meus tempos de política
estudantil, pensei que fosse produto de uma rebeldia adolescente.
Posteriormente, percebi que aquela adolescência não tinha fim, caracterizando,
isto sim, uma incivilidade belicosa que facilmente descambava para gritaria e
ruptura com padrões civilizados.
Mais tarde,
pude ver o mesmo repetir-se, vezes a fio, nas casas legislativas do país,
sempre que a esquerda se encontrasse em posição desvantajosa. Só pode haver
tropa de choque se o choque faz parte dos hábitos da tropa. Quando algo semelhante
ocorre, toda tentativa de restabelecer a ordem é denunciada, de modo invariável
e sistemático, como abuso de autoridade e restrição à sublime liberdade de
bagunçar o coreto.
Pois mesmo
assim, as parlamentares me surpreenderam pelo inusitado de seu gesto. Senadoras
invadindo a mesa dos trabalhos do Senado!... Aquela tentativa de barrar a
votação da reforma trabalhista foi expressão renovada de sua aversão aos
processos democráticos e ao Estado de direito. As declarações que sucederam o
ato permitem trucidar versos de Fernando Pessoa para afirmar que as atoras fingem
com tanta pantomima que, às vezes, fingem ser real a insolência que deveras as
anima.
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* Percival Puggina (72), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.
* Percival Puggina (72), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.