Ao mandar de
volta ao aconchego do lar João Claudio Genu, José Carlos Bumlai, Eike Batista e
José Dirceu, a segunda turma do STF abriu a porteira nos dois sentidos. Saem os
presos e as suspeitas invadem o topo do judiciário nacional.
Chega às raias
do inadmissível que, conforme denunciou o procurador Deltan Dallagnol, o mesmo
grupo de ministros tenha mantido na cadeia delinquentes em situação análoga aos
que agora manda soltar. Como costumava dizer um amigo meu, já falecido: "É
a diferença entre pano de chão e toalha felpuda".
Como pode
proporcionar segurança à sociedade um poder "supremo" da República
que faz esse tipo de diferenciação? Que se conduz de modo ziguezagueante, para
não dizer trôpego? Que decide e logo volta atrás? Onde alguns de seus membros
se consideram em condições de julgar casos ante os quais se deveriam declarar
impedidos? Que mantêm uma vida social comum e
conversações tão frequentes quanto pouco recomendáveis com figuras da
cena política e econômica de quem nós guardaríamos prudente distância? Os membros da Suprema Corte dos EUA, tão logo
assumem suas funções, se recolhem a uma vida quase monástica, evitando toda
atividade social que os exponha a situações de convívio inconveniente.
Sinto muito. A
desejável saída da crise política, pela qual tanto ansiamos como nação,
pressupõe credibilidade no Poder Judiciário. E o STF vem se esforçando por cair
em descrédito. É essa a conclusão inevitável de uma deliberação por 3 x 2 em
matéria de tamanha sensibilidade social, onde isso parece não haver merecido
qualquer consideração por parte da posição vencedora.
Proliferam, então,
as suspeitas. Como não associar esse surto de habeas corpus e as palavras
arrogantes, duras e desrespeitosas do ministro Gilmar Mendes contra os
promotores da Lava Jato, com a ruptura do contrato entre Antonio Palocci e os
advogados que tratariam de sua delação premiada? Um dia o "Italiano"
anuncia estar em condições de disponibilizar a Sérgio Moro atividades ilícitas
com nomes, endereços e anotações que poderiam demandar mais um ano de
investigações. Dia seguinte, recado dado, sabe-se da contratação, por ele, de
advogados especializados em delações. Qual a consequência? Liberdade ainda que
tardia para as toalhas felpudas! Só faltou ser dito: "Ai de quem falar em
delação premiada daqui para a frente!". E Palocci dispensou seus
advogados.
Terá a água
batido em queixos impróprios? A declaração da ministra presidente em entrevista ao programa
"Conversa com Bial" da Rede Globo, na madrugada desta quarta-feira,
3, é uma clara expressão
de insegurança quanto a isso. Disse ela: "A Lava Jato não está ameaçada, não estará. Eu
espero que aquilo que cantei como hino nacional a vida inteira, nós do Supremo
saibamos garantir aos senhores cidadãos brasileiros, de quem somos servidores:
verás que um filho teu não foge à luta". Veremos?
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* Percival Puggina (72), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.
* Percival Puggina (72), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.