Em
artigo anterior, com o título Cria Cuervos, mostrei como o Brasil foi se
tornando um criatório de maus cidadãos, de patifes, mentirosos, velhacos,
corruptos, traiçoeiros e dirigentes de igual perfil. Os cuervos, afirmei, são criados por quantos chamam bandido de herói e
herói de bandido, combatem a polícia, riem da lei, proclamam a morte da
instituição familiar, ridicularizam a virtude, aplaudem o vício, enxotam a
religião, desautorizam quem educa ou usam a Educação para fazer política, e
relativizam o bem e a verdade.
Observe
as movimentações para eleição da presidência da Câmara dos Deputados. Quem for
escolhido pela maioria de seus pares, além de comandar a Casa e exercer várias
outras atribuições importantes, será o substituto eventual do presidente da
República. A disputa se trava entre Rodrigo Maia e Jovair Arantes. O primeiro
dirigiu aquela sinistra sessão em que - forçando um poquito pero no mucho a
expressão - as dez medidas contra a corrupção se transformaram em regras desmedidas
a favor dos corruptos. E fez o possível, Rodrigo Maia, para que tudo
acontecesse conforme articulado nos bastidores, inclusive o tardio horário em
que se desenrolou a escabrosa parte deliberativa da sessão. Do segundo, é dito
que representa o centrão, grupo de deputados do baixo clero, cuja principal
atividade parlamentar seria usar os votos e o poder do bloco para intercambiar
favores que, na maior parte dos casos, não se distinguem de meros negócios.
Tudo indica que estamos lidando com títulos de estampado valor de face.
A essas
alturas, impõe-se perguntar se não há naquele plenário alguém com estatura para
o cargo. É claro que há. E não são poucos, embora não sejam muitos nem em
número suficiente, os homens e mulheres que honram seus mandatos e os exercem
com integridade, voltados ao bem do país. No entanto, eventuais disposições
para concorrer à liderança maior da casa, que entre eles surjam, tropeçam num
grande obstáculo. Nesse parlamento dominado por indivíduos de péssimo caráter é
muito difícil a uma pessoa de bem articular, ao seu redor, um grupo que
viabilize suplantar, em votos, os atuais disputantes. Sei que há iniciativas.
Tomara que funcionem. Mas o cenário que desenho é real.
A sociedade
que cria corvos é a mesma que os elege. E a experiência já mostrou que, no
atual quadro institucional e moral do país, se o Poder Judiciário não afastar
do poder os criminosos, não há lei de "fidelidade partidária", nem da
"ficha limpa", nem projeto das "dez medidas", nem o que
mais ocorra à criatividade nacional, que consiga aprimorar o tipo de
representação política da nossa sociedade. Chega a ser ridículo. O Brasil foi
levado para essa perdição como um adolescente conduzido por más companhias.
_______________________________* Percival Puggina (72), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.