Nenhum país
suporta ser esfolado de tantas formas, por meios que vão da mais fingida
generosidade à mais sofisticada engenharia criminosa. Entre esses dois extremos
cabem muitos outros drenos de recursos: expropriação corporativa; esbanjamento nouveau riche; encargos da solidariedade
ideológica nacional e internacional; descalabro administrativo; keynesianismo
de prodigalidade; loucuras dos Programas de Aceleração do Crescimento, Brasil
Maior, empresas campeãs nacionais; delírios do pré-sal, Jogos Olímpicos, Copa,
e por aí vai.
A partir de
2005, começou a ficar evidente a extensão da crise que sobreviria como consequência
de uma política que surtava ante a ideia da responsabilidade fiscal. O desastre
se tornou inevitável pela teimosa repetição dos erros pois bastam alguns anos
com a despesa crescendo acima da receita para que esse desajuste comece a
derrubar o Produto Interno Bruto. E quando isso acontece, a despesa pública
sacode os ombros e vai em frente como se não lhe dissessem respeito as
dificuldades do caixa. Consequentemente, o déficit não para de aumentar e o PIB
não para de diminuir. Tal realidade deveria suscitar preocupações nas duas
extremidades da relação público-privado. Mas isso não acontece fora de alguns
círculos técnicos.
No primeiro
lado dessa relação estão todos aqueles cujo ganha-pão vem das folhas de
pagamento rodadas no setor público e dos negócios que com ele são mantidos.
Nesse numeroso grupo é quase consensual a necessidade de reduzir o gasto e equilibrar
as contas, contanto que tais providências se apliquem bem longe de onde cada um
opera. No segundo lado dessa relação estão todos os demais cidadãos, aqueles
cujo trabalho no setor privado gera a riqueza da qual saem os tributos que irão
pagar as despesas dos entes estatais. No Brasil, esse grupo de cidadãos, imensa
maioria da população nacional, está
culturalmente submisso à ideia de um setor público mais bem protegido e
aquinhoado nas relações de trabalho. Entre as consequências de tais distorções
se inclui o fato de que poucos jovens brasileiros estudam com tanto afinco
quanto aqueles que decidem se preparar para um concurso público. Que eu saiba
ninguém se dedicou, ainda, a calcular o custo financeiro dessa negligência, tão
comum entre nossos jovens, com a própria formação para a vida na esfera das
atividades privadas.
Resultado da
cultura estatista: o gasto excessivo gera mais reclamações pela má qualidade dos
serviços, do que pelo tamanho e peso tributário que o Estado assume e expande
sem cessar.
***
O parlamentar
petista ocupava a tribuna da Câmara dos Deputados. Da alienação por onde divagava
(Freud explica), era fácil depreender que recém retornara de um voo em 1ª
classe à constelação de Andrômeda. Na viagem, por essas coisas do tempo e do
espaço (Einstein explica), sumiram os catastróficos governos petistas. E ele lançava
maldições à PEC do teto, que denunciava como produto de mentes perversas,
ignorantes de rudimentos da ciência econômica: "Com o que vocês estão
fazendo vai faltar dinheiro para tudo! Já deveriam saber que em tempo de
recessão cabe ao governo gastar para ativar a economia. Certo?".
Errado,
deputado. Como o senhor está chegando de viagem intergaláctica, esquece que a
recessão foi causada pelo aumento desmesurado do gasto e do déficit primário.
Não é que vá faltar dinheiro para tudo no futuro. O dinheiro já acabou,
deputado. Mas eu tenho uma excelente utilidade para sua sugestão: aplique-a em
casa. Em vez de conter despesas, resolva os problemas financeiros da família obrigando
mulher e filhos a aumentarem seus gastos. Depois conte prá gente, deputado.
_______________________________* Percival Puggina (71), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.