A INCÔMODA
MAIORIA QUE FALA NAS REDES SOCIAIS
Percival Puggina
Usuários
de redes sociais jamais deveriam esquecer as lições colhidas nos dias que se
seguiram ao fechamento da mostra Queermuseu, no Santander Cultural de Porto
Alegre, em setembro de 2017. A exibição, com indicação para escolares e
financiamento público (quase um milhão de reais através da Lei Rouanet), tinha
conteúdo sexual, homossexual e transexual associado à infância e a animais, e
vilipêndio religioso com desrespeito a figuras e objetos sacros. Tudo tão ao
gosto de quem se regala com esse tipo de coisa quanto inadequado para crianças.
Só quem estava a serviço de alguma “causa”, na mídia, no Ministério Público e
no mundo cultural poderia não ver ali conteúdo impróprio à infância.
Graças
às redes sociais, imagens chocantes das peças exibidas – repito: expostas ao
público infantil – chegaram ao conhecimento da sociedade provocando rápida
reação de clientes que começaram a fechar contas no Banco, levando-o a cancelar
a exibição. Agiam conforme manda o bom figurino da cidadania em casos assim.
Sem violência, civilizadamente e aos bons modos do mercado, que escolhe com
quem quer manter relações comerciais e decide quais jornais e revistas quer
assinar e quais emissoras de rádio e TV deseja ouvir ou assistir.
Como
lição para a eternidade, o mais importante veio depois. Com raríssimas
exceções, os meios de comunicação, seus formadores de opinião e o “mundo
cultural”, em estado de choque e indignação, colocaram-se contra a opinião
pública e contra o que denominaram reação conservadora. Aquilo, diziam, era um
desrespeito à arte, coisa de gente atrasada, preconceituosa, em conflito com a
laicidade do Estado e “flertando” (eufemismo que a esquerda anda gastando de
tanto usar) com a censura. Ou seja, lançaram-se contra a imensa maioria da
sociedade.
O protesto contra o fechamento do
Queermuseu, realizado ante as portas cerradas do Santander Cultural, reuniu
apenas um punhado de militantes perfeitamente alinhados com o conteúdo exibido
além delas. Nem mesmo uma performance
erótica com mulheres nuas conseguiu atrair espectadores...
Todo
episódio compôs um momento simbólico, espécie de “Alons enfants de la patrie” da cidadania, a simbolizar a queda de
um poder. As redes sociais se impunham como instrumento para democratizar o
direito de opinião, proclamando a independência dos indivíduos em relação aos
fornecedores habituais. Estes, por seu turno, reagiram de modo indignado ante o
declínio de poder. Era como se a cada linha escrita ou cada frase proferida
estivessem a clamar: “Não nos ouvem mais? Não nos atendem mais?”. Ao que se
poderia responder: “Há outras opiniões e pontos de vista a merecerem atenção”.
Nessa
mesma época, ouvi de amigos cientistas políticos a advertência de que as redes
sociais fechavam-se em círculos de afinidade e que poderiam, por isso, ser
ilusórias como informação sobre o conjunto da opinião pública. Era bem
verdadeiro o que diziam. No entanto, essa miríade de círculos uniu
conservadores, liberais e adversários da esquerda que se tinha por hegemônica e
contava com a intensa militância em círculos de influência que tradicionalmente
empalmavam o monopólio do direito se fazer ouvir. O tempo veio mostrar que a
maioria ganhou voz nas redes e que a hegemonia esquerdista era coisa
distrófica, desproporcional. Por isso, os círculos em que se expressa odeiam as
redes sociais e a elas reservam os piores adjetivos.
* Percival Puggina (74), membro
da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e
titular do site www.puggina.org,
colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o
totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do
Brasil. Integrante do grupo Pensar+.