BOLSONARO EM
DAVOS
Percival Puggina
“Os setores que nos
criticam têm, na verdade, muito o que aprender conosco. Queremos governar pelo
exemplo e que o mundo restabeleça a confiança que sempre teve em nós.”
(Presidente Bolsonaro, em Davos)
Quem
esperava Bolsonaro lecionando Comércio Internacional e Ciência Política em
Davos e manifesta frustração por ele não haver feito isso está em situação mais
desfavorável do que a dele. Simplesmente desconhece a realidade. Dorme à margem
dos fatos. Isso não chega a ser problema se for opinião de um cidadão comum à
mesa do bar da esquina, ou de alguém convencido de que a carceragem da Polícia
Federal de Curitiba hospeda um mártir da luta pela democracia e pela moralidade
da gestão pública. No entanto, se a opinião negativa for emitida por quem se
dedica a formar a opinião dos outros, bem, aí estamos perante um caso a cobrar
adjetivos que não escrevo para que o leitor não imagine que estou invadindo a
privacidade de seus pensamentos.
O Brasil
inteiro sabe que Jair Bolsonaro é um homem simples, embora sua formação possa
ser até mesmo considerada sofisticada em comparação com a de Lula, por exemplo.
A diferença entre ambos é a honestidade. Enquanto Bolsonaro não finge ser o que
não é, Lula tem um caráter poliédrico, com uma face para cada circunstância. É capaz
de ir a Davos e prometer que vai acabar com a fome no Brasil e no mundo, jurar
que extinguiu a miséria e descrever o paraíso nacional enquanto o tiroteio
corre solto nas cidades do país. A diferença entre Bolsonaro e Dilma é que
enquanto esta pensa que sabe muito, mas pensa pouco e errado, ele tem
consciência do que não sabe e, por isso, se cerca de pessoas que sabem muito.
Foram
essas virtudes, que se erguem acima do saber humano, que colocaram o novo
presidente em sintonia com a maior parte do eleitorado brasileiro. Foram elas,
também, que o fizeram compor o governo menos político-partidário da nossa
democracia. A prudência é uma característica das almas simples. Foram essas
virtudes que o levaram a exaltar em seu discurso a companhia dos ministros Paulo
Guedes, Sérgio Moro e Ernesto Araújo.
Não, Bolsonaro não é o rei do camarote.
Li, há pouco, que, durante o voo, a bordo do avião presidencial, não quis usar
a suíte e a cama reservada ao presidente. Ficou em uma poltrona, como os demais
viajantes, porque “um comandante não abandona sua tropa; tem que dar o
exemplo”. Aquela suíte e aquela cama eram assiduamente ocupadas pelo comandante
Lula, o santo da carceragem de Curitiba, para folguedos extraconjugais a grande
altitude, enquanto sua tropa, de tantos escândalos, já não se surpreendia.
Assistiam de camarote as traquinagens do rei.
Em seu discurso, Bolsonaro foi polido e
afirmativo. Deu as grandes diretrizes do que fará, falou das reformas, expôs
seus valores, afirmou que o Brasil é o país que mais preserva o meio ambiente
no mundo. E faz isso malgrado a carência de recursos e à custa de uma menor
produção de riqueza (quem mais assume tais sacrifícios?). Enfatizou a
gigantesca obra educacional exigida pela realidade brasileira, assaltada pelos
encolhedores de cabeças. Falou em Deus e em família. E quem não gostou vá
assistir a Globo.
* Percival Puggina (74), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é
arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org,
colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o
totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do
Brasil. Integrante do grupo Pensar+.