Percival Puggina
Todos os
meios de comunicação do país têm produzido matérias sobre o impacto do aumento
que os ministros do STF se autoconcederam com votos vencidos de Cármen Lúcia,
Rosa Weber, Edson Facchin e Celso de Mello. A propósito, em entrevista a O Globo, Marco Aurélio Mello esclareceu que não se trata de
autoconcessão porque o novo valor só comparecerá ao contracheque após a
aprovação pelo Senado Federal. Como se houvesse brio em dose suficiente naquele
plenário para se contrapor a todo o Poder Judiciário do país! Em entrevista
publicada no site Congresso em Foco, o presidente do Senado, Eunício de Oliveira, já adiantou: “Compreendemos o momento que vivemos do
ponto de vista da economia, mas também devemos compreender que cada Poder é
autônomo e pode tomar suas próprias decisões. Não vamos fazer nada de
confronto”, adiantou o senador, concluindo redundante: “Temos que respeitar a
harmonia dos Poderes e o teto constitucional que foi estabelecido para cada um
dos Poderes (sic)”. Cálculo feito pela assessoria das Comissões de Orçamento da Câmara e do
Senado
estima que a despesa com pessoal se elevará em R$ 717 milhões no Judiciário, R$
258 milhões no Ministério Público da União e R$ 400 milhões no Poder Executivo
por consequência da majoração do teto remuneratório. Nos estados da Federação,
o impacto chegará a R$ 2,6 bilhões. Esse é o dano que está sendo divulgado. É um rombo fiscal.
Há outro, porém, de natureza moral. Já foi anunciada a necessidade de manter
congelados, até 2020, os vencimentos dos servidores públicos da União (e não
será diferente nos Estados e municípios). A penúria das contas públicas foi produto
de laboriosa construção. De modo irresponsável, os poderes de Estado e seus
órgãos de controle permitiram que o gasto se elevasse constantemente em tempos
de ruinosa queda da renda nacional e, consequentemente, das receitas fiscais.
Estabeleceu-se o caos dos salários parcelados, atrasados e da perda do poder de
compra. No setor privado, o efeito é bem mais atroz: desemprego em massa. É aí que se produz o pior impacto desse vergonhoso aumento
do STF. É um impacto moral! Como tolerar que ao topo remuneratório do poder
público, aos terraços e coberturas do aparelho de Estado, sejam concedidas
reposições de perdas remuneratórias que são recusadas aos miseráveis operadores
dos porões? Como explicar isso aos que recebem menos, aos que recebem atrasado,
aos que recebem parceladamente seus vencimentos e proventos, bem como aos
desempregados? Como fazê-los entender que não bastante essa dura realidade
terão que custear o ganho adicional das categorias beneficiadas em cascata pela
decisão tomada por sete magistrados com acento no plenário do Supremo? Sim,
porque não se imagine, repito, que os rabo-presos do Senado negarão a seus
futuros julgadores o valor que pretendem ver incorporado a seus contracheques.
* Percival Puggina (73), membro da
Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular
do site www.puggina.org, colunista de
dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo;
Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil, integrante do
grupo Pensar+.