Percival Puggina
Desculpem a expressão pouco polida e, ainda menos, criativa.
No entanto, é a exclamação que me ocorre diante do que se cristalizou como
cenário das próximas eleições parlamentares.
Promover uma grande renovação nas duas casas do Congresso
Nacional era a principal aspiração da sociedade brasileira para a futura
eleição parlamentar em 7 de outubro. Tratava-se de pura racionalidade: afastar
os corruptos, os coniventes com a corrupção e os incompetentes, preservando os
melhores. A conduta dos eleitores, aliás, deveria ser sempre essa, mas os
eventos dos últimos anos – em especial os achados da Lava-Jato e operações
análogas – tornaram tal conduta uma imposição dos fatos a todo eleitor consciente,
a todo cidadão preocupado com o presente e o futuro do país.
Foi no contexto desse clima político-eleitoral que começaram
as pressões para extinguir o financiamento empresarial aos candidatos e
partidos. Seria esse financiamento (e não o irracional modelo político) “a”
causa fundamental da corrupção, por gerar conluio de interesses escusos entre
financiadores e financiados. Tão indigno sistema – assim se dizia - deveria ser
substituído por uma fonte pública, imune a quaisquer compromissos.
Chamada a opinar, a sociedade não aderiu à tese. Nem mesmo a
poderosa organização formada por mais de uma centena de entidades e associações
que se integraram na famosa “Coalizão por Reforma Política e Eleições Limpas”,
sob a liderança da OAB e da CNBB, conseguiu sensibilizá-la. Empenharam-se os
patrocinadores da tese em campanha que se estendeu por mais de um ano, entre
2014 e 2015, tentando, inutilmente, coletar 1,5 milhão de adesões a um projeto
de iniciativa popular. O financiamento público encabeçava as propostas.
Alegavam expressar o desejo social e pediam assinaturas durante missas em todo
o país, mas nem assim conseguiram os patrocinadores coletar a metade disso! O
povo jamais considerou ser de seu dever custear campanhas eleitorais, através
de recursos públicos pelos quais cada cidadão estaria, inclusive, financiando
candidatos contrários às próprias convicções.
A falsa lógica do beatificado fundo eleitoral público,
porém, já havia contaminado os “legisladores” do STF. Em setembro de 2015, por
oito a três, atropelando, inclusive, um projeto em sentido oposto que procurava
disciplinar o financiamento por pessoas jurídicas, o Pleno decidiu que ele era
“inconstitucional”.
Resultado: em 2017, o Congresso aprovou a formação de um
fundo público para a eleição de 2018. Esse recurso, no montante de R$1,7
bilhão, será destinado aos partidos e neles manejados por seus líderes. E quem
são estes? Como regra quase geral, nas executivas nacionais e nas secções
estaduais, são deputados federais e senadores. Ou seja, os recursos “públicos”
serão privatizados por aqueles que, em grande proporção, a sociedade não deseja
ver reeleitos, frustrando-se a efetivação do cristalino anseio nacional pela
renovação. OAB, CNBB e STF estão devendo explicações para esse terrível malfeito
que realiza o sonho de todos os corruptos cuja reeleição estava em risco!
Amarraram cachorro com linguiça, entregando-lhes – logo a eles! – o privilégio
de se financiarem com meios que a nação sangrou para produzir e arrecadou na
forma de tributos federais. Quem quiser furar esse esquema que trate de correr
o chapéu juntando trocados de pessoas físicas, na base da “vaquinha”, ou do me
dá um dinheiro aí.
Apesar desse desastroso papelão, persiste o desejo de
renovação. Não se omita, não vote em corruptos, preserve os bons e renove.
Sobretudo, dedique tempo à escolha que fará, e renove!
*
Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto,
empresário e escritor e titular do site www.puggina.org,
colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o
totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do
Brasil, integrante do grupo Pensar+.