Percival Puggina
Setores
carentes da sociedade talvez se sintam mais seguros com alguém que posa de
provedor de condições mínimas para sua subsistência, ainda que, em tudo mais,
represente permanência na miséria. Setores privilegiados da elite funcional e
empresarial brasileira devem a Lula muito dinheiro fácil, ainda que isso
represente o caos e prisão ali adiante. Não se confunda, então, o povo
brasileiro com Lula e vice-versa. Lula não representa o povo e não representa a
elite porque a fruta estragada não significa o cesto e, menos ainda, a feira.O povo brasileiro, contudo, não é como
Lula. Lula não sabe o quanto ganha, nem quem lhe paga as contas. Não sabe o que
tem e fornece essas respostas aos magistrados que o interrogam. Seus filhos
beneficiaram-se do sobrenome e enriqueceram em negócios que tangenciavam o
governo por vários lados. O povo brasileiro, enfim, não é como esses corruptos
e corruptores do PT. Nem como os do PSDB, do PMDB, do PP e outros que reinaram
nos governos petistas e buscaram proteção no governo Temer. Que a porta de
entrada da cadeia lhes seja de serventia.Como isso foi acontecer? De onde saiu a
ideia de que um país pobre possa providenciar fortuna para quem se dedica às
tarefas de Estado? Por que a corte republicana se julga titular de direitos,
privilégios e padrões de consumo que não estavam sequer em cogitação no período
monárquico? Quem enfrentar a difícil, mas fascinante, tarefa de perscrutar o
perfil desses criminosos de colarinho branco, certamente vai encontrar
indivíduos convencidos de que a unção popular é um “Abre-te Sésamo!” que
franqueia acesso à gruta de Ali Babá. Uma espécie de direito de conquista que
acompanharia o ato de posse. A pessoa não se considera extrapolando os limites
da decência quando achaca um empreiteiro, recebe comissão num financiamento em
banco oficial, ou é gratificado por emendar medida provisória para benefício de
alguém em detrimento do interesse nacional.Foi o mal de Lula e de muitos outros. O
ex-presidente não se constrange com tantos benefícios concedidos por pessoas
que, de algum modo, colheram antes ou colheriam depois os correspondentes
favores. Recebia, na boa, o terreno, o
sítio e suas obras, o tríplex, os jatinhos e helicópteros à disposição, a conta
corrente aberta em seu nome, um estádio para o Corinthians, as milionárias
palestras pagas por empreiteiras que se beneficiavam de seu poder. A ele, a
tantos como ele e aos muitos que julgam normais tais padrões de conduta, convém
lembrar o exemplo do ex-governador gaúcho Valter Peracchi Barcellos num tempo
em que probidade não era exceção, mas regra. O ex-governador, homem de poucas
posses, ao término do mandato, retornou para seu pequeno apartamento de dois
dormitórios num bairro de classe média de Porto Alegre. Amigos – amigos mesmo –
cotizaram-se em segredo e lhe compraram um bom apartamento num bairro
melhor. O coronel, imediatamente,
enfrentando a mágoa e as reclamações dos que o haviam presenteado, doou o
imóvel à Santa Casa de Misericórdia.Por quê? Pelo seguinte, Lula: para que
ninguém ousasse ver, naquela manifestação de estima, reconhecimento por algum
benefício indevido que o governador houvesse prestado aos doadores.
Saibam os mais jovens: o Brasil não era
um país como este em que vivemos hoje.
* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.
* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.