Percival Puggina
Na tela do PC, em fonte tamanho 40, o
e-mail exibia uma dessas frases nos quais o autor berra em caixa alta: “Quem é o imbecil que
escreveu tanta bobagem? O sujeito consegue falar esse monte de asneiras sem
sequer usar a palavra capitalismo”.
Seria eu
o imbecil? Não, ufa! O texto que indignara o missivista era um artigo do excelente
Rodrigo da Silva, editor do Spotniks. Citando fontes oficiais, exibia dados
sobre a pobreza no Brasil após 14 anos de petismo. Por exemplo:
a)
25 milhões de brasileiros vivem com renda domiciliar per capita
inferior à linha de pobreza, e mais de 8 milhões vivem abaixo da linha de
extrema pobreza;
b)
39,5% das pessoas aptas a
trabalhar não possuem sequer o ensino fundamental e mais de 13 milhões de
brasileiros são analfabetos;
c)
apenas 8% têm condições de compreender e se expressar plenamente
(isto é, são capazes de entender e elaborar textos seguindo normas
gramaticais);
d)
apenas 4,9% dos estudantes da rede pública saem do ensino médio
com conhecimentos básicos em matemática;
e)
mais de 35 milhões de brasileiros não possuem acesso sequer ao
abastecimento de água tratada, e quase 100 milhões não dispõem de coleta de
esgoto; do esgoto coletado, apenas 40% é tratado.
Por
aí seguia o trabalho, convertendo em números o que a realidade grita aos nossos
olhos: as péssimas condições do país após uma década e meia de petismo. No
entanto, diante desses dados oficiais, o indignado leitor cujo e-mail chegou ao
meu correio eletrônico usa caixa alta para “gritar” que a culpa dessa realidade
é do ... capitalismo.
Entende-se. Há 40 anos, apenas uma
força política atua em tempo integral no país. Faz política nas vitórias e nas
derrotas. Considera as primeiras como equivalentes a tomadas revolucionárias do
poder e as segundas como golpes que precisam ser desconstituídos. Nenhuma outra
corrente exerce sequer fração da influência que o petismo desempenha no
conjunto dos meios formadores de opinião – mídia, rede de ensino, mundo
acadêmico, sindicatos e suas centrais, carreiras jurídicas e poderes de Estado,
Igreja, instituições culturais. E por aí afora. É um aparelho articulado,
imenso e, principalmente, robotizado para uma tarefa universal de massificação
na qual a história, os fatos, as ciências, tudo tem uma e apenas uma expressão:
a que serve à práxis e deve ser repetida sem cessar.
Por isso, Lula é um santo injustiçado.
Por isso, Moro é um agente da CIA. Por isso, velhacos viram heróis e
guerreiros. Por isso, o PT “acabou com a pobreza”. Por isso, todo miserável que
vemos nas ruas é uma exceção, uma impossibilidade material. Por isso, Cuba é um
paraíso e a Venezuela quase. Por isso, as incitações do PT para o dia 24 de
janeiro. Por isso, sempre que
necessário, palpiteiros são convidados e aparecem para julgar os julgadores e
absolver petistas em idiomas como Punjabi, Malaio, Khmer e até em francês. Por
isso o governo petista arrombou os fundos de pensão das estatais e os
funcionários da Petrobras, Correios, BB e CEF fazem festa para Lula e seus
companheiros.
Por
isso, a pobreza brasileira é denunciada como produto de algo que simplesmente
não temos: o capitalismo. Logo o
capitalismo, um sistema econômico em cujo ranking, entre 186 países, ocupamos o
lugar nº 118! Isso é robotização, daquela
primitiva, dos brinquedos infantis em que se dava corda para andarem e
apitarem.
* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é
arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org,
colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o
totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do
Brasil. integrante do grupo Pensar+.