Percival Puggina
A ideia
passou-me pela mente como sombria nuvem enquanto participava da missa de Natal
na Igreja São Pedro, em Porto Alegre. E se aquela celebração não fizesse o
menor sentido para mim? E se eu não tivesse fé? Poderia acontecer de não tê-la,
dado que tantos não a têm. Fui tomado
por um sentimento de gratidão, ciente de que nada fiz para merecer tal graça. E
os suaves compassos da canção Amazing
Grace vieram à mente – “Esta Graça me
trouxe até aqui e me conduzirá para casa”.
Na
certeza de que tenho uma alma, sinto-me mais seguro alimentando-a com
importantes convicções do que resfolegando meu corpo em dúvidas que nada
informam, nem consolam, nem alegram o espírito. Prefiro enfrentar as tormentas
da existência segurando a mão de Deus do que as bengalas do mundo material.
Aliás, as esperanças divinas são tão superiores às vãs expectativas humanas!
Considero vantajoso almejar a vida eterna em vez de crer que tudo acaba num
corredor de cemitério, atrás de uma frase saudosa, inscrita em placa de
mármore. Prefiro aprender de Deus que se revela do que de filósofos que escutam
silêncios e tateiam trevas. Sim, meu caro, é preferível ter fé. Nada se perde
com ela e muito se perde sem ela. Falo por mim. E falo para ti.
Durante
muitos anos supus, como tu, que a fé fosse um recanto silencioso onde se
saciava a ignorância humana perante questões complexas. Ou, dito sem
artifícios, que o Deus dos tempos modernos seria sofisticado descendente do
trovão reverenciado pelos nossos ancestrais do paleolítico inferior. Agora,
convenhamos, quem precisa de um Deus para fins que o Google e a Wikipédia
cumprem razoavelmente bem?
O Deus
que um dia encontrei no cristianismo é um Deus que se conforma à pequenez do
sacrário, à gruta de Belém e à imensidão do Cosmo. Com infinita paciência –
vejam que privilégio!- esse Deus é meu pedagogo nos meandros do pensamento e
nas picadas da ação. Recebi dEle verdades, princípios e valores que só me fazem
bem.
A fé
nada me toma em troca do muito que me dá. Rezo para que encontres “such amazing
grace”.
* Percival Puggina (73), membro
da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e
titular do site www.puggina.org,
colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o
totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do
Brasil. integrante do grupo Pensar+.