Há uns
dois meses assinei a revista Época, do Grupo Globo. Já no primeiro exemplar
pude perceber para que lado soprava o vento editorial. Aumentei minha
contribuição semanal ao lixo seco.
Na
edição desta semana, três colunistas dão sermões e excomungam a opinião pública
em virtude da reação nacional à presença de crianças em museus e mostras ditas "de arte"
cujos conteúdos e "performances" qualquer pessoa responsável
reconhece totalmente impróprios a esse público. O noveleiro Walcyr Carrasco, a
sei-lá-o-quê Ruth Aquino e o professor de jornalismo Eugênio Bucci desfiam sua
ira nada santa contra a população. Este
último, num assomo de cólera que raia o tipo "Sai de perto!", calcou
as dianteiras no teclado e jogou as traseiras em sucessivos coices contra quem
diverge de seus gostos socioculturais. Não se alarme. Estou sendo
moderadíssimo, leitor. Veja se não. No texto que tem por título "A sanha
moralista nas redes sociais", o professor Bucci produz frases assim:
· O
conservadorismo está à solta, com sua tara furibunda para encarcerar a
política, banir a alegria e matar a imaginação.
· ... podem
considerar a hipótese de que elas (as redes sociais) nos levem de volta aos
calabouços do passado.
· Não dá mais
para esconder. O que está em marcha nesta terra é o Festival de Besteiras
Reacionárias que Assola o País.
· A turba
virtual baba de saudade da repressão política e moral dos anos 1970.
· O
conservadorismo pátrio é um lobisomem que uiva em surto.
· No campo da
Cultura e da Arte o conservadorismo também uiva. Prega censura, execração,
castigo. Prega a ordem dos cemitérios como ideal de vida.
· Quando sente
o cheiro de imaginação e prazer, vitupera sobre os "bons costumes sem
libido".
· O discurso moralista, além de rabugento
e barraqueiro, é mistificador: acredita que a televisão tem o poder satânico de
programar o pensamento dos seres humanos.
Não
informem ao referido professor de jornalismo, mas é claro que a TV exerce
influência sobre a opinião pública. Esse é o negócio dela, aliás. Não fosse
assim, as emissoras não viveriam de patrocínios comerciais que apostam alto
nessa possibilidade, ora bolas! Tampouco digam ao inspirado mestre das artes que
não dá para comparar o Davi de Michelangelo ou Leda e o Cisne de Leonardo da
Vinci com desenhos de sacanagem produzidos com traços infantis para atrair
olhares de crianças. E o boicote, sabemos todos, é filho democrático e sadio da
mesma liberdade que ele diz defender.
Foi para
justificar essas investidas contra a inocência infantil que a Globo, no último
dia 8, arrastou para o programa Fantástico todo o peso da emissora e de seus
atores para, em nome da diversidade e da liberdade, atacar uma
"censura" e defender uma laicidade do Estado que em momento algum
estiveram em jogo. A sociedade tem todo o direito de se interrogar sobre por
que o fez o Grupo Globo, dado que nenhuma reação teria acontecido se crianças
não estivessem sendo atraídas a tão maliciosas arapucas. Para completar o
serviço, a empresa praticamente promulgou como plataforma sua a ideologia de
gênero que, por motivos óbvios, o Congresso Nacional, as Assembleias
Legislativas estaduais e as Câmaras Municipais erradicaram dos respectivos
planos de educação.
A
"Vênus platinada" tomou mau caminho. Jogou-se contra a opinião
pública em matéria gravíssima.
* Percival Puggina (72), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é
arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org,
colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o
totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do
Brasil. integrante do grupo Pensar+.