Percival Puggina
Há quem creia que o "politicamente
correto" tem algo a ver com convívio social respeitoso. No entanto, não é
assim. Respeitar, e mais do que isso, amar o próximo, é o segundo maior
mandamento afirmado pelo cristianismo. Surrupiar essas qualidades e virtudes
sociais para o âmbito do "politicamente correto" é uma fraude
praticada por quem, de hábito, não lhes dá a mínima e chama fascistas os cristãos
e conservadores que as pregam e exercitam.
O "politicamente correto" é
uma fórmula esperta de ação política. Manifesta-se como produto de sistemática
construção por incessante repetição, para:
· proclamar vencidas discussões que ainda estão
abertas, impondo conceitos, destruindo valores e ofendendo crenças alheias;
· dar por consensuais e moralmente superiores
concepções que não são uma coisa nem outra;
· eximir de críticas pessoas e práticas que põe
sob seu manto protetor.
Trata-se, portanto, de algo político no
sentido mais ladino e enganoso dessa ciência. E não por acaso, a tarefa de
construir postulados "politicamente corretos" é pretensão exclusiva
dos partidos e grupos de esquerda, rotulando como incorreta toda a divergência.
O politicamente correto tem sido uma
trincheira para dar cobertura à ideologia de gênero; tratar bandidos como
vítimas; identificar como "fobia" e incorreção as mais tênues
divergências; arrancar crucifixos das paredes; proteger os mais variados tipos
de cotas; justificar o desaprisionamento; defender a sacralidade do Queermuseu;
e por aí vai.
Todas as reações contrárias ao
Queermuseu foram carimbadas por jornalistas corregedores da opinião pública
como "politicamente incorretas". Chegava a ser bisonho. Diante das
portas fechadas do Santander Cultural, manifestantes nuas defendiam a
sacralidade do profano enroscadas em práticas sexuais. No interior do recinto
fechado pelo proprietário, o realmente respeitável (a infância em todas as suas
dimensões) e o realmente sagrado (uma religião e seus símbolos) haviam sido
profanados e vilipendiados. E o vilipêndio cobrava para si exibição pública!
Não é contraditório? O mesmo critério político, legislativo e jurídico que, em
nome do respeito "politicamente correto", tenta inibir humor e piadas de gosto
duvidoso, não se sente minimamente desconfortável - ao contrário, não raro se
assanha - quando o ataque se dirige a quem recebe, através dos séculos, o amor
e a adoração de bilhões de pessoas.
Mal virou a semana, novamente em Porto
Alegre - cidade sob assédio, bem se vê - um monólogo exibido com patrocínio
público (essas drogas não sobrevivem da bilheteria) apresenta Jesus Cristo como
um travesti e "Rainha do céu". A tentativa de sustar-lhe a exibição
por via judicial trombou contra o ... "politicamente correto".
Entendeu o magistrado do feito que não precisa citar lei para negar a medida
solicitada "porque todos somos iguais". Questão que não estava em
causa. Fosse a pessoa exposta em situação aberrante alguém vivo, poderia certamente
requerer a proteção de sua imagem. O magistrado é, por certo,
respeitabilíssimo, mas esse tal Jesus Cristo? Quem por Ele?
A convergência dos assédios contra o
cristianismo e os cristãos, contra a infância e quem busca protegê-la, fica
claramente percebida quando nos lembramos das palavras de Jesus: "Deixai
vir a mim as crianças, não as impeçais porque o Reino dos Céus pertence aos que
se tornam semelhantes a elas" (Mt 19:14).
Para muitos isso é simplesmente intolerável.
* Percival Puggina (72), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é
arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org,
colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o
totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do
Brasil. integrante do grupo Pensar+.