domingo, 24 de novembro de 2013

Mulheres são mais vulneráveis à Aids

Questões ligadas à cultura e ao gênero explicam a situação
Gabriella Vitoria

 
A Aids continua sendo um tema que envolve inúmeras discussões, mesmo depois de anos de avanços nos tratamentos e pesquisas. Com relação ao sexo feminino, os aspectos são ainda mais delicados. Através da observação de questões culturais e de gênero, é possível perceber uma posição de vulnerabilidade das mulheres com relação à doença. É através dessa ótica que Viviane Soares, mestre em Serviço Social pela UERJ, desenvolveu sua dissertação.

Em “Contextos de autonomia e vulnerabilidade: histórias e particularidades de mulheres vivendo com HIV/Aids”, a autora buscou apresentar as características que envolvem a vida de mulheres portadoras do vírus e os aspectos, gerais e particulares, responsáveis por colocá-las em uma posição de maior fragilidade.
 
Um fato que contribuiu para o desenvolvimento da pesquisa foi a experiência de Viviane no Gabão, país localizado no Centro-Oeste do continente africano. Lá, ela pôde entrar em contato com o trabalho de ONG's e ministérios, em que alguns cargos são ocupados por mulheres, que lutam contra a epidemia da doença, crítica na região. “É bastante comum vermos em cultos evangélicos e missas, a intervenção do Ministério da Saúde falando sobre o vírus HIV e as formas de prevenção”, comenta. O contexto tradicional e cultural desse local, que envolve práticas como a poligamia, é um dos pontos analisados por Viviane que explica o alto índice de casos femininos.


A pesquisadora também percebeu, no Brasil, algumas semelhanças com esse local. A subordinação de muitas mulheres, a resistência dos homens em usar preservativos e a dificuldade de suas parceiras em convencê-los disso são fatos que, ainda hoje, persistem e contribuem para agravar o quadro. Renda e escolaridade, intimamente ligados ao acesso à informação e saúde, também são importantes indicadores e devem ser considerados.

Além dessa experiência, Viviane trabalhou como residente, no Hospital Universitário Pedro Ernesto, com um grupo de mulheres soropositivas denominado “Parceiras da Vida”. Nele, participam mulheres infectadas ou afetadas, como irmãs, esposas ou filhas, pelo vírus da AIDS. O grupo reúne-se desde 2002, em encontros mensais, para discutir sobre as dificuldades das mulheres com relação a doença.
 
A principal característica desse trabalho é pensar além das consultas médicas e índices gerais da doença, levando em consideração o relato pessoal de cada mulher. Viviane conta que o trabalho propicia “um espaço para que as usuárias possam compartilhar suas angústias com relação ao diagnóstico, as esperanças, expectativas, e identificar as distintas formas de violações de direitos, não só no âmbito da saúde, mas em outras áreas da vida”. Além do espaço para a discussão, as parceiras da vida tem acompanhamento clínico de profissionais e realizam diferentes atividades, como artesanato.

Viviane constata, em sua dissertação, que a AIDS continua sendo vista como “uma doença incurável que causa medo e vem cercada de preconceitos e discriminações” e que, apesar de décadas de sua descoberta e estudo, ainda é fortemente associada à perversão sexual e promiscuidade. “Frequentemente identificamos que o impacto social e psicológico do estigma em outras interações (com familiares, amigos, trabalho, vizinhos e parceiros amorosos) implica em encobrimento, isolamento e depressão. Assim podemos dizer que o preconceito persiste e, ainda hoje, requer um enfrentamento por parte das mulheres que vivem com HIV/Aids”, afirmou a pesquisadora.